29.11.09

Mantra da decepção

E a música não cessa. A maior prova de que o Universo comunga de uma ordem sutil, duma harmonia interna, uma máquina dos diabos a rodar e rodar infinitamente, fumegando, apitando, rangendo e produzindo.

Correm as capivaras ressabiadas nos capinzais da CPTM, correm na pista os homens largando notas gordas pelos fundilhos, contra aviões que não lhe darão fuga. É tarde para largar o osso? Se ri o macaco no galho do outro, aquele que já não pode escolher pelo choro, rindo também: feito noz aberta contra os rochedos, o ketchup escorrendo na tela.

E a música não pára. Assumem os presidentes de si mesmo, fazendo as nações à sua imagem e semelhança, acelerando a noção de que o futuro está por trás de dentes que não usaremos, palavras que não plurificaremos, dedos à escanteio - pois que já não nos farão falta.

Mordem ainda os que conseguem, minoria chegada numa moda muito fora de moda, viola desafinada na multidão de ocupados úteis. E dóceis. E quem falou que precisaríamos de delirantes clones? É tudo tão mais sórdido, e patrícios se comem pelo rabo moral e pelo cabo da tevê.

Ah!, o amor. O que não pode, o ultrajante e bastardo amor da Humanidade pela ciência de si mesma. Afaga e esconde entre os seios gordos e sufocantes, amaciando o estertor com afeto e dedicação. Depois repousa o corpo já inerte e vela para que nenhuma ave agourenta devolva seu pó à terra; para que nada lhe seja maior que a mumificação e o simulacro. Pois deve parecer ainda vivo, para todo o sempre. Deve seguir vivendo no limbo dos sonhos, do intervalo antes do além e já muito longe de qualquer redenção.

Feliz o homem que é incorrupto pela inaptidão. Jamais experimentará do veneno, e será grande e arrogará ares de sábio, em sua estupidez patente.

E todos o respeitarão.

2 comentários:

Rafael disse...

Sou o primeiro a postar?

martin montenegro disse...

Não. E já me deixaram coisas mais inspiradas.

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SAO, SP, Brazil
...just someone playing hard.