10.5.06

Parágrafo Único:


onde mora o coração do Homem, ali também está o seu tesouro.

Cap.1º - Onde se trata do desaparecimento da palavra

... é quando sinto que suas (minhas) respostas superam as minhas (minhas) perguntas. e vai além, não deixam brecha. por que, afinal, eu procuraria outra coisa? engraçado. e o ato de escrever perde sentido, porque sempre mascarante, mascarador. e por pensar nas teclas a teclar eu esqueço o que penso, ou pensava. e me preocupo em apertar os botões. juntar as duas coisas passa a ser a meta a alcançar, o ponto e objetivo a ser batido. pensar sem parar, teclar sem titubear. eu estava pensando na história do Chandra, em como... preciso tomar um chá. já volto... (...)

... aproveitei pra dar uma mijada. caramba! esse frio da alta madrugada congela os ossos. só as pontas dos dedos se mexem convincentemente. o resto adormece, se não dormita, verdade, em estado de semi-hibernação. chá quente à mão, ávido por teclar imprudente, volto ao computador, onde Kronos Quartet é sempre uma boa companhia, nessas horas frias e solitárias. mas isso ainda vai ganhar corpo, vou cortar um monte, então não me preocupo com as beiradas possíveis. tudo isso é lixo, mas do lixo tirarei a vida que me constrói, seus enigmas decifrados, suas chaves para um vislumbrar mais depurado de mim mesmo. se é o que quero dizer, mas acho mesmo que não. tudo é teatro, eu sou teatral. patético. o chá ainda está muito quente. mas isso é informação inútil, e depois será podada. ao menos eu exercito os dedos sem culpa. sei que sou 20% descartável, ao menos. deixem que então eu 'expila' esse quinto prolixo. esquentar as mãos no chá, na caneca de chá, ainda é uma arte, desde e antes que eu a descrevesse a uma obtusa garota, num e-mail, uns 4 anos atrás, apaixonado que estava por suas covinhas ladeando o sorriso lacônico e uma difusa pinta que minha mente, nesses tempos últimos, fez por duvidar da existência - mas que, se é veraz, ainda está lá, caindo pelo canto do lábio, à direita do coração. depois descobri que o sorriso era um cacoete, não uma inteligência, e desanuviei.

mas eu dizia do Chandra. Ele corre atrás do deus da Lua pelas vielas de seu vilarejo, mas o deus cavalga em sua "biga", ou coisa que o valha, e está sempre à frente, sendo puxado por dez velozes cavalos, que mais parecem raios de luar (sua charrete/ carruagem/ biga é a própria Lua!), e ele os chicoteia, quase alçando vôo. e quando Chandra tenta alcançá-los, consegue agarrar o vespeiro onde o deus prendera o luar que carregava a sabedoria das coisas da infância, deste reino, estado de espírito que é a infância. ou alguma coisa assim, bem abstrata - mas que deve parecer simples e concreta. terrível, ando pensando nisso há meses. mas vamos lá. então o menino tem o vespeiro nas mãos, que - novo! - o deus iria levar para casa, mas não viu que deixara pra trás na fuga, de volta para sua "morada". é lua nova, os mortos podem falar com Chandra, assim que ele atravessa os portões da cidadela, e indicam o caminho a seguir. Chandra caminha em direção à floresta, e às suas entradas, ouve as cigarras que tentarão seduzi-lo para devorar seu cérebro, pensando que se trata de uma raiz, um cerne de madeira podre. Chandra não sabe mais se identificar, não sabe que é um menino, menos ainda que está em busca de sua identidade, e nem seu nome. é nessa condição que as cigarras tentam atacá-lo, mas ele se apavora, e alguns tigres o ouvem, quando passam por perto (...)

isso me lembra de outro trecho que talvez coloque no "Pseudo": os ratos que invadem a cabeça das pessoas pelos ouvidos ou pelas narinas, enquanto essas dormem, e ali se instalam, devorando o cérebro, lenta e gradualmente. os ratos são portadores de um vírus mortal: a curiosidade. basta que alguém seja "invadido" por um destes roedores, e começa a fazer perguntas e mais perguntas. até que um dia morra de curiosidade, se esta não for satisfeita. o que acontece é que a informação incha o cérebro, e sufoca o rato, que precisa de espaço pra sobreviver, por isso rói o cérebro - a "informação" - que ali encontra. a pessoa que está hospedando o roedor começa fazendo perguntas, inicialmente. depois vai perdendo o conhecimento de mundo, das coisas, do tempo e do espaço. e termina sem saber de nada, com a cabeça vazia. à beira da morte, já não faz perguntas, sequer tem voz. apenas gemidos e choros mastigados. rói objetos e alimentos crus, e qualquer coisa que se lhe der nas mãos. depois que cai ao chão, só vegeta, até o fim. vai ficando verde, depois ocre, depois vira terra, e seu coração se transforma numa raiz fértil, uma batata-doce, talvez. os piores viram mandioca selvagem. alguns ainda tem a sorte de virarem mandioquinha, e já ouvi casos de curiosos mortos que viraram amendoim, com as sementes se espalhando pela superfície antes do tempo, todos bicados e espicaçados pelos pássaros gigantes.

queria ver você lá. esse jazz , e algumas garotas em cima do balcão, sinuosas dançarinas. uns trouxas enrubrecidos de alcohol, e só. já vai fechar, as cadeiras estão em cima das mesas.

agora vou dormir. só vou deixar acabar essa do Thelonious Monk, e vou. só mais essa, é pra valer. que eu já estou caindo em cima do teclado, e revirando mais que erva do diabo - nunca mais como a carne com abóbora que a Sandra faz! esse abajur até que funciona, é bacana. mas tudo se ilumina: agora tenho um bom palpite...
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...just someone playing hard.